IORRAN SEBASTIÃO BASTOS
-E aí, pai, como foi o almoço com
ela?
Foi a primeira coisa que perguntou
quando ele entrou no carro para irem a um show de música que haveria naquele
dia. O cantor João Bosco, aquele mesmo
que disse em uma de suas canções que “o amor quando acontece, a gente esquece
tudo o que sofreu um dia”, ia ser homenageado em um evento na cidade.
- Foi ótimo, filha e acho que
você já vai ter uma madrasta e não demora muito.
- É mesmo?
A pergunta veio junto com aquele
semblante preocupado-alegre, uma feição lutando para se sobrepor à outra para
não deixar constrangimentos para o pai, quando viu a cara de só risos dele.
-Sabe, filha depois de alguns
casamentos as coisas não são como a gente gostaria, aquela entrega imediata,
típica da ousadia dos apaixonados. Ela mesma sabia um pouco das coisas do
coração, afinal já não é mais uma menininha. Também tinha lá seus conflitos.
Mesmo assim ficou procurando uma
explicação que conseguisse sintetizar aquele momento pelo qual passava. O
coração não tem nenhuma compatibilidade com planejamentos, no entanto. Estava
pensando meio ansioso, meio angustiado o que falaria para ela quando buzinasse
à porta da casa. Sabia que ela ia perscrutar algo. Estava curiosa para compreender
mais aquela meia história que ele havia
lhe contado no domingo anterior sobre a primeira namorada dele na
pré-adolescência. Agora ele e ela se reencontraram depois de mais de trinta
nos, sós novamente e com um horizonte cheio de possibilidades de viver o que
não foi possível naquela ocasião. Num estalo, veio-lhe a explicação em forma de
canção e foi assim que respondeu – cantando – logo que ela fez a pergunta:
“Ah, meu coração que não entende
O compasso do meu pensamento
O pensamento se protege
E o coração se entrega inteiro
sem razão.
Se o pensamento foge dela
O coração a busca, aflito.
E o corpo todo sai tremendo
Massacrado e ferido do conflito.”
CONFLITO (Canção de Fagner)